domingo, 31 de agosto de 2014

O ABC dos Motores

O Randy Smith escreveu um artigo chamado “Care and Feeding of the C/L Stunt Engine” para a revista Flying Models em março de 1993 e ele tem servido de referência desde então.  No primeiro parágrafo ele diz “Use o combustível correto e provavelmente você não perceberá nada, mas o combustível errado fará você reclamar, ou pior fará seu motor gritar, arrotar e funcionar com absolutamente nenhuma consistência”. Ou seja grande parte das pessoas que não conseguem usar um motor corretamente , deve-se ao fato de não usarem o combustível correto.
No segundo parágrafo ele ressalta que a maioria dos combustíveis encontrados no mercado usam uma base sintética (óleo) e são misturados para o voador de “R/C Sport”. Estes combustíveis são muito baixos em conteúdo de óleo, geralmente na faixa entre 12 a 15%%. Realmente naquela época os combustíveis comercias vinham com pouquíssimo óleo, mas hoje achamos com mais freqüência combustíveis comercias com percentual de óleo entre 16 a 20%, o que veremos mais a frente que ainda NÃO é suficiente para uso em VCC. Ele diz ainda, que isso não é aceitável em VCC. Existem vários motivos, mas o mais importante é que nós não funcionamos nossos motores em VCC em um 2 tempos de pico (altíssimo giro) o tempo todo, mas em uma larga faixa de 4 tempos ou em um 2 tempos mais rico. Toda vez que você acerta seu motor para entrar e sair das manobras (como em um típico funcionamento em 4-2-4), VOCÊ NÃO ESTÁ APENAS PEDINDO PARA O COMBUSTIVEL LUBRIFICAR O MOTOR, ELE TAMBÉM TEM QUE RESFRIAR O MOTOR. Ou seja, se olhássemos nos manuais dos fabricantes dos principais motores vamos chegar a conclusão que 18% de óleo no combustível é mais do que suficiente para LUBRIFICAR o motor, mas não para RESFRIAR. Outro detalhe importante: os combustíveis comerciais, em sua maioria, são destinados ao mercado de R/C onde raramente se voa com o motor em “full throttle” (acelerador no máximo) o tempo todo, a maioria de quem voa R/C usa sempre na maior parte do vôo menos de 50% do acelerador, somente na decolagem e em algumas manobras mais críticas que se excede esse limite. Por isso que o percentual de óleo em combustíveis de VCC é critico, porque o óleo não queimado no motor tem o papel de carregar o calor para fora do motor.Alguns bons anos atrás a maioria dos combustíveis tinham apenas um tipo de óleo: óleo de rícino (“castor oil”). Ainda é um óleo bom , mas com muitos pontos bons a alguns ruins. Alguns pontos bons: ele carrega o calor para fora do motor, ele forma uma boa película em todas as superfícies do motor, especialmente quando estão quentes. Uns poucos pontos ruins: ele queima e adere nas laterais do pistão e na ranhura do anel e a outras partes que estejam suficientemente quentes e carboniza a câmara de combustão. Isto causa excesso de fricção e calor e vai arruinar seu motor com o tempo.A alternativa ao óleo de rícino é o óleo sintético e a maioria dos combustíveis comerciais o tem  e alguns têm somente óleo sintético (no texto original o Randy dizia que a vasta maioria dos combustíveis comerciais tinham somente óleo sintético naquela época, mas sabemos que hoje a maioria tem uma mistura (“blend”) de 80% sintético e 20% rícino). As maiorias dos fabricantes de combustíveis usam um tipo de óleo sintético: os glicóis polialcalinos. Os óleos sintéticos são feitos por varias empresas e estão disponíveis em uma larga faixa de pesos moleculares e viscosidades. Antigamente eu usava o óleo sintético da Motul , mas recentemente me recomendaram mudar para o óleo sintético da Klotz.Os óleos sintéticos também tem seus pontos bons e ruins. Alguns pontos bons: são lubrificantes muito bons e não contém parafina (cuidado, pois, alguns óleos de rícino contém parafina, o que fica bem evidenciado, pois ao se misturar eles com o metanol é nítida a formação de duas fases, uma que acaba decantando), tem boa capacidade de carregar resíduos, formam bons filmes, são resistentes à formação de resíduos e vão ajudar seu motor a ficar limpo.  Os pontos ruins são: eles não dão proteção a corrosão por si próprios, eles não formam boas camadas em superfícies quentes como o óleo de rícino e eles queimam em calor excessivo. Por isso quando aumentamos o percentual de óleo sintético no combustível percebemos também um aumento nos níveis de fumaça expelida pelo motor.Como podemos ver ambos tem suas vantagens e desvantagens e por essas razões que eles podem trabalhar bem melhor misturados do que sozinhos. Até aqui eu me concentrei em comentar e traduzir quase toda a parte onde o Randy falava sobre os dois tipos de óleo, dada a importância disso para chegarmos ao combustível ideal para cada caso de motor de VCC.Outra parte importante do artigo é onde o Randy diz que não existe uma única fórmula de combustível para VCC que funciona em todos os motores, dada a vasta gama de motores que temos hoje (mais ainda do que na época em que o artigo foi escrito) e os vários tipos de funcionamento que podemos almejar (4-2-4 ou 4-4-4 ou ainda 2-2-2). O que ele nos diz é uma boa fórmula para os mais comuns tipos de motores. Tenha certeza em escolher  um fornecedor de combustíveis  que possa lhe fornecer combustível consistente no dia a dia (que não tenha altos e baixos de qualidade!). No entanto, nenhum fabricante de combustível vai fazer a mistura nas proporções que necessitamos para VCC, a não ser que você encomende e compre uma quantidade muito grande dessa fórmula. Fique longe dos fabricantes e fornecedores de combustíveis que se neguem a dizer o percentual real de óleo no combustível ou que diga que ele tem uma única fórmula que funciona bem para qualquer tipo de motor. Nas lojas aqui no Brasil, em geral os vendedores entendem mais de R/C e vão tentar empurrar o combustível com menor percentual de óleo. Eu geralmente peço o combustível com o maior percentual de óleo (que normalmente é 20%  , o que ainda é insuficiente para a maioria dos motores funcionando em VCC), pois assim terei que adicionar menos óleo no final.
Agora vamos a parte mais importante do artigo: Qual o melhor percentual de óleo para cada tipo de motor de VCC?
Para motores como : Fox 35 , OS Max 30/35-S , os velhos McCoys e K&Bs  use 28% de óleo preferencialmente metade rícino e metade sintético . Eu diria que pode-se usar até 29% de óleo nesses motores, dado que nosso clima é mais quente aqui no Brasil. Não use óleo sintético em um motor destes quando velho e acostumado com óleo de rícino porque o óleo sintético vai remover a camada de goma do óleo de rícino (chamado aqui de verniz) do conjunto camisa-pistão e deixar você com um motor gasto e acabado.Para motores com embuxamentos maiores como a série OS FP, OS LA, Magnun GP, Thunder Tiger GP, Enya SS, use entre 23 a 25% de óleo sendo metade rícino e metade sintético. Vejam que o Randy diz entre 23 a 25% de óleo para o clima temperado dos EUA, aqui no Brasil eu diria algo entre 25 a 27 %%. Várias vezes tenho visto pessoas querendo obter bons resultados com estes motores aqui no Brasil e quando pergunto o percentual de óleo eles dizem: eu uso 20%, pois o manual diz que 18% já é suficientes para uma boa lubrificação. Está explicado o principal motivo do porque quase ninguém consegue rodar estes motores aqui no Brasil em 4-2-4? Aliás, estes percentuais de óleo que o Randy recomenda é para o tipo de motor, não para o tipo de funcionamento, ou seja, se você quer rodar estes motores em 2-2-2 você também deverá observar estes percentuais de óleo.Para a maioria dos motores de VCC roletados (com rolamentos), tais como STG21-46, ST-G51, ST-V60, OS 40/46 SF, Magnum PRO, Thunder Tiger PRO, Enyas roletados, ele recomenda 23% sendo metade rícino e metade sintético. Eu diria que aqui para o Brasil podemos usar entre 23 a 25% de óleo nesses motores . Eu voei muito tempo com os OS 40/46 SF-S ABC com 25% de óleo sem problemas em 4-2-4.Para os motores pipados como OPS, OS VF, PA (veja que na época em que ele escreveu o artigo ele ainda não fabricava nem o PA 40, que saiu no ano seguinte), Ro Jetts , e demais pipados ( não sei o porquê que o Randy coloca o ST-51 que era lançamento na época nesta categoria) ele recomenda 15% de óleo sintético e 7% de óleo de rícino , perfazendo assim um total de conteúdo de óleo em 22% . Realmente nos motores pipados muito óleo de rícino faz com que sujem e carbonizem muito cedo, muitas vezes arruinando o motor.Para os motores 4 tempos não adianta ficar experimentando muito com esses motores em termos de combustíveis: deve-se usar 20% de nitro e 20% de óleo sendo tudo óleo sintético (20/20).Você deve ter certeza que seu motor foi amaciado apropriadamente. Isto irá variar entre 6 tanques de combustível para alguns motores até quase 2 galões para outros. Use de preferência o mesmo combustível que você vai usar para voar seu motor e tente fazer o amaciamento em uma bancada pois esta é a maneira mais fácil e adequada de se fazer um amaciamento apropriado. Para a escolha da hélice deve se optar por uma de diâmetro de 1 polegada menor do que se pretende voar e 1 de passo a menos. Por exemplo: se você pretende voar com uma hélice 11x6 com um determinado motor, amacie-o com uma 10X5. Isto permite que o motor de mais rotações por período de tempo de amaciamento e você irá impor menos carga no motor durante o amaciamento, uma vez que o motor funcionando em uma bancada está sob carga bem maior do que em vôo. Comece com um  funcionamento em 4 tempos bem rico para motores de conjunto de camisa-pistão de ferro ou motores anelados e vá aos poucos deixando ele funcionar em um 4 tempos mais rápido e depois coloque em períodos de 2 tempos ainda rico por períodos de tempo curtos. Eu normalmente para estes motores faço o amaciamento de seguinte forma: ligue o motor  por 5 vezes de 1 minuto em um 4 tempos bem rico deixando esfriar bem entre cada funcionamento. Depois ligue por 5 vezes de 2 minutos com uma leve fechada de agulha, mas ainda em 4 tempos mas um pouco mais rápido. Depois ligue por 5 vezes de 3 minutos, na mesma faixa de rotação das ligadas de 2 minutos, mas de umas beliscadas na mangueira para que ele funcione por períodos máximos de 10 a 15 segundos em 2 tempos, cuidado para não beliscar muito forte a mangueira e deixar a mistura muito pobre o que pode causar superaquecimento do motor ou até mesmo cortar o funcionamento. Depois funcione 5 vezes de 4 minutos da mesma forma que as 5 de 3 minutos. Depois funcione por 5 vezes de 5 minutos da mesma forma. Ao término você terá funcionado se motor por um total de 75 minutos (1 hora e 15 minutos) o que é mais do que suficiente para a maioria dos motores desse tipo. Cuidado para não ultrapassar o limite de 120 graus durante o amaciamento, eu normalmente uso um termopar para monitorar o amaciamento. A cada 3 ou 4 funcionadas é bom dar uma medida na temperatura de funcionamento. Não use escape para amaciar o motor. Muita gente me pergunta  : se eu vou voar com o escape, por que não posso usar o escape no amaciamento na bancada? E eu sempre respondo: qual a função do amaciamento de um motor na bancada: fazer uma simulação completa das condições do vôo ou promover um ajuste controlado e gradual das peças internas do motor? O escape só vai aumentar a temperatura do motor durante o amaciamento. Após o motor estar devidamente amaciado ele deverá ser capaz de funcionar em 2 tempos sem superaquecer e nem dar falta, independentemente do tipo de funcionamento que almejamos no modelo posteriormente (4-2-4, 4-4-4 ou 2-2-2).Para motores com configuração de conjunto camisa-pistão AAC, ABC, ABN ou ABL o procedimento que sigo é bem parecido com o anterior, mas ou invés de se ligar 5 vezes de cada período de tempo eu ligo 3 vezes. Mas cuidado pois alguns motores desta categoria são bem mais duros de amaciar e ai o procedimento anterior é mais adequado. Aguardem em breve estarei mandando um artigo específico sobre o amaciamento de motores para VCC F2B.Alguns motores vem com muita limalha de fábrica quando novos. Se não forem limpos antes da primeira funcionada essa limalha vai para o conjunto camisa-pistão o que muitas vezes poderá prejudicar  o amaciamento, reduzir a vida útil do motor ou ainda arruinar o motor durante o amaciamento. O ideal é se desmontar o motor novo (isso mesmo, desmontar um motor zero bala), lavar todas as peças com álcool e remontar antes de proceder o amaciamento. No entanto se você não sabe desmontar e remontar um motor adequadamente peça para alguém que sabia fazer isso por você. Recentemente eu comprei um STG-51 chinês de um amigo, que estava com os lacres de fábrica ainda. Quando inspecionei o motor percebi que o mesmo estava travado (isso mesmo, um motor zero bala que não vira!). Após desmontar esse motor completamente eu fiquei estarrecido com a quantidade de limalha que veio da fábrica. Limpei tudo e remontei e ainda tomei o cuidado de filtrar o álcool que usei na limpeza para ter uma idéia da quantidade de limalha e sujeira que o motor veio de fábrica  Por outro lado quando fiz o mesmo procedimento com um Enya SS40 zero bala, não encontrei absolutamente nada de sujeira nem de limalha dentro,Para finalizar gostaria de lembrar que deve-se usar um bom óleo “after run” entre cada sessão de vôos ou quando você guardar o motor por longos períodos. Eu tenho hoje em minha coleção algo em torno de 70 motores, alguns fabricados nas décadas de 60, 70, 80, 90 e alguns mais recentes. Sempre os conservo colocando “after run” a cada seis meses. Quanto aos motores que usamos constantemente o uso do “after run” também é um "must" devido à natureza do combustível que usamos. Quando o nitrometano ou qualquer nitro parafina queima deixam como subproduto o ácido nítrico que junto com  a água carregada parcialmente pelo metanol (o metanol é higrófilo, ou seja, adsorve a umidade se não for armazenado adequadamente) vão corroer especialmente os rolamentos e o virabrequim. Veja na  um virabrequim de OS 40 FP em avançado estado de corrosão, seu ex dono provavelmente não teve cuidado em usar “after run”,OBS: quando dizemos 4-2-4 ou 4-4-4 ou 2-2-2 estamos nos referindo a funcionamento em 4 tempos (não necessariamente afogado, mas não "apitando" ainda) ou em  2 tempos (já "apitando") e não estamos nos referindo ao motor serem 2 tempos ou 4 tempos. Uma vez  amigo meu não entendeu essa diferença e por consequência perguntou: como vou deixar esse motor funcionando em 4 tempos na bancada se esse motor é 2 tempos? Outro amigo (após dois anos de Mini Fai) me perguntou: o que é 4-2-4? Um motor 2 tempos pode funcionar em 4-2-4, 4-4-4 ou em 2-2-2, mas um motor 4 tempos obviamente só funciona em  4-4-4. No regime de 4 tempos a câmara de combustão explode um ciclo de compressão sim e um ciclo não, no regime de 2 tempos ela explode em todos os ciclos de compressão.


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